O centro da fé católica é a Ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo, com isso, temos que a celebração da Páscoa é o auge do ano litúrgico. Portanto, desde seu início, a Igreja reconheceu a necessidade de um tempo de preparação para que os fieis possam viver com intensidade o mistério pascal de Cristo. Nosso antigo pároco, padre Luiz Paulo, dizia que viver a Quaresma era caminhar com Jesus rumo à Jerusalém.
PASCOM PSJVZ por: Amarildo B. – 15/02/2021 DESTAQUE ESPECIAL, QUARESMA
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Origem, espiritualidade e aspectos litúrgicos
Nos três primeiros séculos do Cristianismo, não havia um tempo de preparação específico para a Páscoa, sendo prescritos dois dias de jejum pleno anteriores à Páscoa. No início do século IV, este período passou a uma semana, e na metade do século, acresceram-se mais três semanas a este período. Finalmente, ao final do século IV, o tempo de preparação (e de jejum) passou a ser de quarenta dias, levando em conta a simbologia deste número na Bíblia (40 dias do dilúvio, 40 anos de travessia do povo de Deus no deserto rumo à terra prometida, quarenta dias de Jesus no deserto, etc.).
Este período se inicia na Quarta-Feira de Cinzas, já que o dia de domingo não era considerado um dia de jejum, e a quarta-feira já possuía um caráter de oração e penitência. De acordo com a carta apostólica do Papa Paulo VI, quando aprovou as Normas Universais do Ano Litúrgico e o novo Calendário Romano geral: “O tempo da Quaresma vai da Quarta-feira de Cinzas até a Missa da Ceia do Senhor, exclusive” (n. 28). Ou seja, o término deste período se dá antes da missa vespertina da Quinta-Feira Santa, início do Tríduo Pascal.
Este tempo de quarenta dias foi inspirado numa grande catequese que a Igreja primitiva realizava. Ela durava quarenta dias, tempo em que os pagãos (catecúmenos) se preparavam para receber o batismo no Sábado Santo, dentro da Solenidade da Vigília Pascal. Acompanhavam também os irmãos que tinham cometido pecados graves para retornarem à fé. Esse tempo era marcado pela penitência e oração, pelo jejum e pela escuta da Palavra de Deus. Eles eram os “penitentes”, os quais renovavam a fé e recebiam o batismo ou eram reintegrados à comunidade no Sábado Santo.
Daí que a Quaresma possui duas dimensões: batismal e penitencial, sempre com o olhar voltado ao mistério pascal. Diante destas dimensões, cada ciclo (ano A, B ou C) tem itinerários diferentes e complementares a partir do terceiro domingo, já que nos três ciclos, o primeiro domingo da Quaresma traz a passagem da tentação de Jesus no deserto e o segundo domingo, a Transfiguração do Senhor.
No ano A, retoma-se os elementos ligados ao batismo, com as leituras da passagem do encontro de Jesus com a samaritana, a cura do cego de nascença e a ressurreição de Lázaro. No ano B, temos o itinerário pascal, com a passagem da expulsão dos vendedores do templo, a menção à elevação da serpente por Moisés (prefigurando a Cruz) e Cristo como grão de trigo que precisa cair na terra para gerar frutos. Por fim, no ano C temos o itinerário penitencial, com as passagens da figueira sem frutos, a parábola do filho pródigo (ou do pai amoroso) e a passagem da mulher adúltera.
O que seria o sexto domingo da quaresma é chamado de Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor, que marca o início da Semana Santa. A cor litúrgica é a roxa e nas missas do período, são omitidos o Glória e o Aleluia, exceto nas solenidades (dia de São José a 19 de março e Anunciação do Senhor, a 25 de março, por exemplo)
Neste período, cada fiel tem a oportunidade de chorar seus pecados, clamar a misericórdia de Deus e exteriorizar sua conversão interior por meio do jejum, da oração e da caridade, o que culminará na renovação das promessas do batismo na Vigília Pascal.
A Quaresma é um grande retiro, centro do Mistério de Cristo e da nossa fé e salvação. Tempo privilegiado de conversão e combate espiritual, de jejum medicinal e caritativo. A Quaresma ainda é, sobretudo, tempo de escuta da Palavra de Deus, de uma catequese mais profunda, que recorda aos cristãos os grandes temas batismais em preparação para a Páscoa. É um caminho bíblico, pastoral, litúrgico e existencial para cada cristão pessoalmente e para a comunidade cristã em geral.
Campanha da Fraternidade
Além da cor roxa, das cinzas, do jejum, oração e escuta atenta da Palavra de Deus, no Brasil, a Quaresma também é marcada pela realização da Campanha da Fraternidade, organizada pela CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
A Campanha teve origem na iniciativa de um grupo de padres recém-ordenados sob supervisão de D. Eugênio Sales, reunidos em Natal, que promoveu caminhadas, de casa em casa, e semanas da fraternidade, visando a doação de alimentos para famílias pobres. Em 1962, em Natal, foi realizada a 1ª. Campanha da Fraternidade com uma coleta em favor das obras sociais da Arquidiocese, como sacrifício da comunidade para a Quaresma.
A partir de 1964, a Campanha da Fraternidade passou a ser realizada em nível nacional, liderada pela CNBB.
A realização durante a Quaresma vai ao encontro do que é previsto no item 110 da Sacrossantum Concilium, constituição apostólica sobre a Sagrada Liturgia, que estabelece que a penitência quaresmal deve ser também externa e social, que não só interna e individual. Estimule-se a prática da penitência, adaptada ao nosso tempo, às possibilidades das diversas regiões e à condição de cada um dos fiéis.
A Campanha da Fraternidade auxilia a prática quaresmal, pois proporciona uma profunda reflexão sobre a situação do Brasil e do mundo, e incentiva a prática de atos concretos em favor dos mais necessitados. A Igreja deve estar sempre atenta aos males que afligem o povo de Deus.
Jeremias, Amós, Isaías, João Batista e o próprio Cristo denunciaram a opressão do povo, a hipocrisia. Somos chamados a abraçar todos os aspectos da fé e ser verdadeiros profetas, pelo batismo. Sigamos o exemplo do bom samaritano, que acolhe aquele que precisa. Talvez não consigamos mudar todas as estruturas, mas podemos começar pelo que está ao nosso alcance.
Para o ano de 2021, a Campanha será ecumênica, com a participação de igrejas pertencentes ao CONIC – Conselho Nacional das Igrejas Cristãs do Brasil. O tema escolhido foi “Fraternidade e Diálogo: compromisso de amor” e o lema “Cristo é a nossa paz: do que era dividido, fez uma unidade” (Ef. 2.14). De acordo com a CNBB, o objetivo da Campanha deste ano é “através do diálogo amoroso e do testemunho da unidade na diversidade, inspirados e inspiradas no amor de Cristo, convidar comunidades de fé e pessoas de boa vontade para pensar, avaliar e identificar caminhos para a superação das polarizações e das violências que marcam o mundo atual”.
Conclusão
Este texto é o primeiro de várias propostas de formação que iremos divulgar nesta Quaresma, para que nossa comunidade entenda mais este tempo importante da vida da igreja, participe dos exercícios propostos para o período: celebrações, reflexões, meditações, jejuns, mutirões de confissão, Via Sacra, gesto concreto no Domingo de Ramos ou colaboração com as instituições mantidas pela Igreja para auxiliar os necessitados.
A pandemia nos atingiu no meio da quaresma no ano passado e, infelizmente, não foi possível realizar presencialmente as atividades da Igreja. É tempo de retomada da vida em comunidade, com todas as cautelas e a Quaresma é um ótimo período para vencermos este inimigo. Uma boa preparação nos levará a celebrar a Páscoa renovados em Cristo.
Foto: Reprodução/Acervo Pascom
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